Na tarde desta quinta-feira o STF decidirá se a antecipação terapêutica de parto, no caso de gravidez de feto anencéfalo, fere os artigos 124, 126 e 128, incisos I e II, do Código Penal.
Trata-se do julgamento da ADPF (Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental) nº 54, que iniciou em 2004, quando a CNTS (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde) ajuizou ação pretendendo que o STF “declare inconstitucional, com eficácia erga omnes e efeito vinculante, a interpretação dos artigos 124, 126 e 128, incisos I e II, do Código Penal, como impeditivos da antecipação terapêutica do parto em casos de gravidez de feto anencefálico diagnosticados por médico habilitado, reconhecendo-se o direito subjetivo da gestante de se submeter a tal procedimento sem a necessidade de apresentação prévia de autorização judicial ou qualquer outra forma específica do Estado”.
O ministro Marco Aurélio concedeu, à época, liminar, mas a decisão foi cassada pela maioria do Plenário.
De 2004 para cá, mais de vinte instituições foram ouvidas em audiências públicas, a exemplo da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, Igreja Universal, Conselho Federal de Medicina e Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos.
Hoje, para fazer a interrupção da gravidez nesses casos, é necessário autorização judicial. Os juízes que autorizam fundamentam no princípio da dignidade da pessoa humana e no fato de que em se tratando de anencefalia, não há propriamente aborto já que este pressupõe a expectativa de vida, o que não ocorre quando há ausência de cérebro.
Dos seis ministros que votaram ontem, 5 foram a favor do reconhecimento do direito à interrupção (Marco Aurélio Melo, Carmem Lúcia, Rosa Weber, Luiz Fux e Joaquim Barbosa) e um contra (Ricardo Lewandowski).
O Ministro Marco Aurélio encerrou seu voto afirmando que "a questão posta neste processo – inconstitucionalidade da interpretação segundo a qual configura crime a interrupção de gravidez de feto anencéfalo – não pode ser examinada sob os influxos de orientações morais religiosas. Essa premissa é essencial à análise da controvérsia."
Em seu voto Carmen Lúcia, afirmou: “Numa democracia, a vida impõe respeito. E este feto não tem vida, mas a mãe e o pai desta criança têm e sofrem com esta gravidez. Por isso, voto a favor da descriminalização do aborto de anencéfalos.”
Luiz Fux, por sua vez, declarou: “O STF evidentemente respeita as mulheres que desejarem realizar o parto mesmo que anencéfalo. Temos que avaliar se é justo, sob o âmbito criminal, colocar essa mulher no banco do júri por conta de um aborto. É lamentável que a mulher a padecer dessa tragédia [carregar o feto anencéfalo] durante nove meses seja criminalizada, e jogada no banco do Tribunal do Júri”.
Ricardo Lewandowski que votou contra, sem enfrentar diretamente o mérito do pedido, afirmou que a lei sobre o tema deve partir do Parlamento, e não do Judiciário. E lembrou que o Congresso Nacional tem projetos de lei que disciplinam o assunto.
É necessário apartar as convicções religiosas do direito, pois o direito não pode ficar à mercê da religião quando se está dentro de uma República laica, com fortes bases democráticas. Assim, obrigar a mulher a carregar um feto sem expectativa de vida é uma agressão a sua integridade física e psicológica. Assemelha-se à tortura.
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