O coletivo “Advogados
para a Democracia”, vêm a público repudiar
o Relatório
da “Comissão Especial para Acompanhamento da Desocupação do
Local Denominado Pinheirinho” da OAB de São José dos Campos.
Tomamos conhecimento do
Relatório da OAB/SJC no dia 13/06/2012, através de notícia
publicada no site do TJ/SP, com o seguinte título “OAB
descarta violação dos direitos na reintegração de posse no
Pinheirinho”. Pelo
título da notícia já era possível ter uma ideia do conteúdo
porvir.
O Relatório inicia
descrevendo as histórias de vida e o drama dos moradores do
Pinheirinho de forma emotiva, esclarecendo que é “fruto
de um esforço conjunto que envolveu dezenas de advogados que
voluntariamente acompanharam toda a problemática em suas diversas
fases e realizaram incontáveis diligências”. Estranho, pois,
acompanhamos de perto durante as três semanas que se seguiram ao
massacre, visitando os acampamentos, conversando com os desabrigados
e cadastrando famílias juntamente com integrantes de movimentos
sociais, do Condepe-SP, advogados e voluntários; e não tomamos
conhecimento da presença das “dezenas de advogados”. O único
advogado voluntário representando a OAB/SJC que estava presente era
o Doutor Aristeu Cesar Pinto Neto.
Cabe esclarecer que no
dia 04/02, quando estivemos em São José dos Campos, enquanto
aguardávamos na recepção do Hospital Municipal (juntamente com o
Deputado Adriano Diogo, o advogado Antonio Donizetti Ferreira e
outros companheiros) pela ficha médica do Sr. Ivo que, segundo
testemunhas, foi violentamente agredido por policiais, tivemos a
oportunidade de conversar com o advogado e então presidente da
Comissão de Direitos Humanos, Aristeu Cesar Pinto Neto que nos
relatou a insatisfação da diretoria da OAB com a sua atuação na
defesa dos direitos dos moradores de Pinheirinho. Pela conversa ficou
bem claro que a OAB de São José dos Campos endossa a ação da
Prefeitura, do Governo do Estado e do Poder Judiciário contra os
moradores. Alguns dias depois (em 15/02) soubemos que a referida
comissão foi extinta pelo presidente da OAB local sem justificar os
motivos.
O relatório procura
justificar no tópico “As
causas que contribuíram para a tragédia”,
que o ocorrido se deu pela posição irredutível dos moradores,
insinuando que a morosidade do processo foi em razão dos “inúmeros
recursos, defesas apresentadas pelos advogados dos moradores”(sic).
Contrariando a própria
retórica, pois a alegação é de que não se está à procura de
culpados, afirma que os moradores e advogados visavam,
“principalmente o incentivo à ocupação desordenada com o
objetivo justamente de afrontar o Poder Judiciário e impedir a
execução de suas ordens”.
Além disso, o relatório
busca culpar os líderes de um suposto “movimento” seguindo o que
foi veiculado pelo poder do Estado e pela grande mídia, deixando
inequívoca a intenção de manipulação da opinião pública. O que
ocorreu foi simplesmente exercitar o direito à dignidade humana por
parte dos moradores, seus representantes legais e alguns
parlamentares.
O tal “movimento”
nada mais é do que representantes da comunidade exercendo os seu
direito constitucional de se organizar. Trata-se de mais uma forma de
criminalização de organizações sociais.
A frieza na elaboração
e conclusão do relatório, posta em defesa do poder judiciário e
das instituições públicas é no mínimo estranha, quando a
obrigação da OAB deveria ser a defesa intransigente dos direitos
humanos contra tudo e todos, inclusive a despeito do alegado
Isto porque, a realidade
fática é seguramente muito diferente daquela traçada pelo
relatório, que estranhamente foi publicado na página central do
site do Tribunal de Justiça de São Paulo, que a toda evidência não
necessita de defensores.
Oportuno registrar que há
fragilidade nas alegações do dito relatório, pois o terreno
desapropriado era parte do patrimônio de uma empresa falida e,
portanto, faz cair por terra a defesa da propriedade em desfavor da
moradia e consequentemente da dignidade da pessoa humana, não sendo
crível que a OAB compactue em favor daqueles que, para expulsar os
moradores do Pinheirinho, alçaram o direito à propriedade da falida
sem se importar com a sua necessária função social.
O relatório em nenhum
momento apontou objetivamente quais foram as medidas tomadas pela OAB
para assegurar o direito daquelas minorias, a não ser comprometer-se
em levar a sociedade uma discussão superficial e tendenciosa sobre
fatos vivenciados pelos moradores daquela comunidade. Além disso,
segundo o relatório, foi garantido o ingresso de um advogado
representante de uma empresa tendo escolta policial para a retirada
de cerca de trinta mesas de bilhar dadas em comodato a diversos bares
do local reiterando a exclusiva preocupação em preservar o
patrimônio empresarial não sendo oferecido aos moradores a mesma
possibilidade com relação aos seus pertences.
A instituição afirma
que participou de várias reuniões com diversos órgãos públicos
envolvidos na logística da desocupação, ou seja, sabia que o Poder
Público não estava preparado para receber as mais de mil famílias
que seriam desalojadas, sabia que não haveria moradia para elas e
mesmo assim apoiou a desocupação, preocupando-se tão somente em
proteger o direito de propriedade.
Está claro que havia
condições de prever que seria impossível uma operação dessa
magnitude sem que ocorresse o desrespeito aos direitos dos cidadãos
que ali residiam. As famílias foram obrigadas a deixar seus lares,
pertences, documentos e animais domésticos para trás sem ter para
onde ir e a OAB tinha ciência desse fato e se omitiu apoiando a
operação. Como se isso não bastasse, o relatório afirma que houve
uma parceria do Município com o Poupatempo permitindo a emissão de
RG para aqueles que “não possuíam” este documento e, novamente,
omite o fato de que esses cidadãos perderam seus documentos devido à
ação irresponsável do poder público quando da desocupação.
Não podemos deixar de
esclarecer que todas as afirmações supracitadas decorrem, também,
do testemunho in loco de membros deste Coletivo uma vez que estiveram
por diversas vezes nos abrigos CAIC D, Pedro, Ginásio de Esportes D.
Pedro, Ginásio de Esportes Jardim Morumbi e Ginásio Esportivo Vale
do Sol onde foi possível verificar o absoluto desrespeito com as
famílias que residiam no Pinheirinho, a saber:
- A estrutura dos abrigos não era ideal e nem adequada para atender a demanda;
- As famílias estavam amontoadas nos abrigos superlotados a ponto de se “acomodarem” nos banheiros dos ginásios. Havia crianças, idosos e deficientes;
- Os banheiros eram coletivos sendo que muitos deles eram abertos não oferecendo privacidade às pessoas;
- A moradia de cada família se limitava a um colchão no chão dos abrigos.
- Os animais que sobreviveram ao massacre e se perderam dos seus donos, perambulavam nesses ambientes fortalecendo os problemas de higiene e saúde.
- A comida fornecida pela Prefeitura era de péssima qualidade e insuficiente para alimentar a todos. Muitos reclamavam que há dias não havia mudança no cardápio e que a alimentação era muito salgada e azeda. O café da manhã se limitava a pão, café e leite insuficientes para todos, em especial, ao grande número de crianças.
- Foram disponibilizados, de forma precária, atendimento médico, assistência social, psicólogos e policiamento.
- Nos abrigos, as pessoas tinham medo de represália da prefeitura e evitavam comentar sobre o que viviam ali pois afirmavam que existiam agentes do poder público infiltrados entre os desabrigados. Ainda assim foi possível ouvir centenas de testemunhos.
- Verificamos a falta de medicamentos e o desespero para a obtenção dos mesmos.
- As famílias pediam para que doações fossem entregues diretamente a elas porque nem tudo que era doado chegavam para os desabrigados.
É inadmissível à OAB,
que nasceu sob a premissa de defender os direitos humanos, analisar o
caso apenas no campo da legalidade deixando à margem a percepção
de legitimidade, se esquivando da sua função precípua de luta pelo
Estado Democrático de Direito e se omitindo diante da prevalência
da propriedade improdutiva da massa falida sobre o direito à
moradia.
Clécio Marcelo Cassiano
de Almeida
Ellen Caixeta
Francisco Jucier Targino
Nilva Souza
Rodrigo Sérvulo da Cunha
Walter Luz Amaral
ADVOGADOS PARA A
DEMOCRACIA
Fontes:
http://www.midiacaricata.blogspot.com.br/search?updated-max=2012-02-01T21:16:00-02:00&max-results=12
http://www.midiacaricata.blogspot.com.br/2012/02/terror-nao-termina-em-sao-jose-dos.html
http://www.midiacaricata.blogspot.com.br/2012/02/videos-testemunhas-do-massacre-em.html
http://www.midiacaricata.blogspot.com.br/2012/02/continuamos-recebendo-doacoes-para-o.html
http://www.midiacaricata.blogspot.com.br/2012/02/pinheirinho-vive-estado-de-excecao.html
http://www.midiacaricata.blogspot.com.br/2012/02/imagens-do-massacre-de-pinheirinho-isso.html
http://www.midiacaricata.blogspot.com.br/2012/02/terror-nao-termina-em-sao-jose-dos.html
http://www.midiacaricata.blogspot.com.br/2012/02/videos-testemunhas-do-massacre-em.html
http://www.midiacaricata.blogspot.com.br/2012/02/continuamos-recebendo-doacoes-para-o.html
http://www.midiacaricata.blogspot.com.br/2012/02/pinheirinho-vive-estado-de-excecao.html
http://www.midiacaricata.blogspot.com.br/2012/02/imagens-do-massacre-de-pinheirinho-isso.html
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“LUTA.
Teu dever é lutar pelo direito. Mas no dia em que encontrares o
Direito em conflito com a Justiça, luta pela Justiça” (Eduardo
Couture).
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