Por Luciene da Rocha Vieira
Para entendermos acontecimentos históricos e seu real alcance, o distanciamento trazido pela passagem do tempo geralmente nos dá maior clareza. As recentes manifestações contra o aumento das passagens de ônibus em todo o Brasil mobilizaram milhares de jovens e ainda estamos vivendo o calor deste momento, infelizmente colorido com cenas de bárbara violência orquestrada pela PM de São Paulo. Isso pode dificultar entendermos o que acontece de maneira objetiva.
Para tentar entender as origens desta mobilização pesquisamos na Wikipédia (que sabemos nem sempre ser uma fonte confiável, mas a única com informações históricas disponíveis no momento) seu texto nos diz que o movimento surgiu a partir de manifestações populares contra o aumento de ônibus em Salvador em 2003, que teriam sido encampadas pelo movimento estudantil e parcialmente atendidas. O movimento passa a existir oficialmente a partir do V Fórum Social Mundial em 2005. Seus princípios seriam o apartidarismo, a independência e a horizontalidade e decisões por consenso isto é, todos teriam iguais responsabilidades e direitos, a fim de garantir real democracia.
Pudemos observar através do material de vídeos que encontramos na web que suas práticas são bastante semelhantes à de movimentos como o Occupy Wall Street, que reúne pessoas de várias orientações políticas e procura dar a todos igual participação. Na prática, sabemos que várias organizações de esquerda que militam no movimento estudantil participam de forma ativa do movimento, o que para nós não o desqualifica e explicaremos logo abaixo o porque.
A principal característica dos movimentos como o Occupy, Primavera Árabe, 15M e outros surgidos recentemente é o fato de que uma parcela significativa de seus militantes não se sentem representados pelas formas de organização e participação política tradicionais, como os partidos. Sabem ser manipulados pela mídia, pelos políticos e pelas organizações de poder em geral, mas nem sempre tem a clareza de como isto ocorre. Mesmo assim, tem uma certeza: o seu lugar não é nem pode ser no espaço tradicional em que se dá o jogo político, com suas sutilezas e manipulações. Necessitam de ação direta, não tem paciência para as manipulações que se dão nesses espaços que tem como objetivo o exibicionismo intelectual de alguns que desejam controlar uma “massa” dócil aos seus caprichos. Não que lhes falte inteligência, mas é uma inteligência prática, que vem da necessidade de demandas políticas concretas, surgidas no cotidiano.
Esse tipo de movimento só virá nos enriquecer no atual momento político do Brasil. Ao contrário de muitos companheiros de esquerda – particularmente vários militantes e simpatizantes do PT que tem se manifestado nas redes sociais – que veem as manifestações como uma ameaça, eu discordo porque a meu ver este movimento é maior do que os vários agrupamentos que dele participam, maior do que a mídia que procura capitalizar os acontecimentos de forma a tentar “queimar’ a recente administração do prefeito Fernando Haddad, maior do que a violência policial orquestrada pela carcomida elite paulistana, liderada pelo asséptico governador Geraldo Alckmin”. A informação imediata vinda da web foi capaz mais uma vez de desmontar ao menos parcialmente a rede de intrigas jogada pelo PIG e revelou manifestantes que tentavam apagar os erros iniciais dos atos de vandalismo e foram sistematicamente sabotados pela PM, com a clara intenção de criminalizar o movimento.
Se as lideranças do PT tiverem a sabedoria de dialogar com o Movimento Passe Livre, isto só fará com que ele cresça e amadureça, tendo que lidar com a dura realidade do jogo político, sem perder sua autenticidade. Quem sabe esta não é a resposta às nossas preces (ateus, sorry, he, he) por aliados que não sejam tão fisiológicos como O PMDB? Todos sabem os prejuízos que isso trouxe aos governos e a mobilização petista, o quanto companheiros sinceros, militantes históricos do PT, tem de engolir gigantes sapos todos os dias sem perder a fé. O fato de que vários dos atores políticos agora em pauta discordam da forma do PT governar pode vir a ser um complemento saudável para o debate democrático, para variar mais à esquerda. Precisamos sair da pauta que a mídia golpista nos impõe, dar um salto de qualidade que é necessário agora que o governo petista é uma transformadora realidade em nosso país. Ser transformador não quer dizer que não tenha defeitos. Este pode ser o momento de nos tornarmos revolucionários.
Luciene da Rocha Vieira - Historiadora, professora das redes públicas estadual e municipal.
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