domingo, 5 de outubro de 2014

A DESCONSTRUÇÃO DE MARINA

 
Do Jurista Sérgio Sérvulo da Cunha (www.servulo.com.br)

Costumo deitar cedo, e levantar cedinho.

Ontem abri uma exceção para assistir ao último debate dos candidatos à Presidência, antes do primeiro turno. O debate terminou de madrugada, mas valeu a pena, por muitos motivos. 

Na década de (19)50, costumava acompanhar meu tio em muitas de suas atividades como presidente do diretório municipal do Partido Democrata Cristão; participei da campanha de Antonio Feliciano (1953), cujo vice prefeito Arthur Rivau, daquele partido. Posso dizer entretanto que minha primeira lição, na política, foi em 1984, quando, retomada a autonomia municipal participei da campanha de Rubens Lara, e ajudei a redigir seu programa de governo. Corri o risco de dizer ali que seriam mantidos em ordem os serviços prestados pela Prefeitura. Obviamente, a situação retrucou que Lara estava elogiando o bom estado dos serviços municipais.

Em campanhas políticas acontece assim: um candidato jamais pode reconhecer algum mérito no outro, e jamais pode reconhecer algum erro ou demérito próprio. Essas situações serão exploradas a seu dano e em favor do outro. Com isso, a verdade é posta de lado.

No debate de ontem, apenas num momento aflorou a sinceridade: foi quando Marina(PSB), deixando de lado a pasteurização, fez um apelo quase patético a Luciana Genro (PSOL), dizendo mais ou menos assim: - Por que você quer me igualar aos candidatos “x” e “y”, dizendo que eu apoio os banqueiros, quando você sabe que temos tantas afinidades, e nossos programas são tão parecidos? 

Quando Marina dizia trazer algo de novo na política, esse algo – que encantava de pronto – era ela mesma, sua história e sua personalidade. Ao render -se entretanto, à lógica interna das campanhas, e tanto mais quanto mais decaía nas pesquisas, ela própria se desconstruía. Essa pergunta, que Marina fez a Luciana, com as mesmas razões Dilma (PT) poderia lhe ter feito. Ela rendeu-se à lógica interna das campanhas, por exemplo, ao acusar Dilma de haver aumentado os juros, quando na verdade aconteceu justamente o contrário.

Não sei se algum dia a sagacidade, a sedução e a retórica que são utilizados nos debates serão substituídos por outras virtudes, mais humanas e mais belas. Mesmo hoje, com todos os percalços, ainda há lugar na política para essas virtudes (depende da aprovação que a sociedade efetivamente lhes conceda); se Marina não vencer, como tudo indica, é importante que possa criar o partido do seu coração, e exercer sua liderança a partir de outras posições.

De todo modo, foi alto o nível desse debate. Quase todos os candidatos mostraram-se preparados. A participação de candidatos nanicos, que, por isso, são eleitoralmente descomprometidos, enriquece a discussão; e a participação de pândegos lhe confere
humor.

Com todos os seus percalços – em que se incluem a corrupção e o seu assédio pelo poder financeiro – a política hoje, e a administração pública, estão muito melhores do que na década de (19)50. Naquela época – e isso também acontecia aqui em Santos – havia banditismo político, com capangas pagos por candidatos. 

Era assustador o nível do coronelismo. Se o coronel era dono de tudo, dispensado de transparência e de contas, desconhecia-se, por exemplo, o termo “corrupção”. 

Vamos votar, certos de que estamos trabalhando para a construção de um Brasil melhor, onde tudo que estiver na lei tenha sido previamente discutido e democraticamente aceito. A democracia, como sabemos desde Churchill, é um regime extremamente imperfeito, mas inigualavelmente superior a qualquer outro.

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