quarta-feira, 20 de abril de 2016

CRIMINALIZAÇÃO DA POLÍTICA


Por Sérgio Sérvulo da Cunha

Ao proferir seu voto pelo impeachment da presidente, no dia 17, o deputado Jair Bolsonaro homenageou um notório torturador. Algumas pessoas, indignadas, estão cogitando responsabilizá-lo criminalmente.

Com todo o respeito, peço licença para divergir.
Não considero que as opiniões do deputado Bolsonaro sejam as melhores. Mas ele pode manifestá-las livremente, protegido não só pela imunidade parlamentar – que só os parlamentares têm – mas também pelo direito de expressão, que todos os brasileiros têm.

Na democracia, todos – inclusive os inimigos da democracia e os mentecaptos – têm o direito de manifestar suas opiniões. 

Guardemo-nos de criminalizar a política. Quem gosta de fazer isso é a oposição irresponsável.
Algumas pessoas têm mencionado o código penal, principalmente em seu art. 286, que pune a apologia do crime.

Queridos, o código penal brasileiro é de 1940, promulgado em plena ditadura, e anterior à Constituição. Quem gosta de aplicá-lo são os juízes mão-pesada, que entopem as prisões com pretos e pobres; e que desrespeitam a presunção constitucional de inocência, esquecendo na cadeia pessoas detidas “preventivamente”.

A Constituição, que é de 1988, garante a liberdade de expressão, e veda toda espécie de censura, de natureza política, ideológica e artística. Gostar de Hitler, de Bush e de Donald Trump não é crime. Homenageá-los publicamente também não. 

Se tentássemos deduzir a priori os direitos fundamentais, o direito de opinião seria o primeiro, a expressão primária da liberdade pessoal. “De todas as liberdades” – disse Ruy Barbosa – “a do pensamento é a maior, a mais alta. Dela decorrem todas as demais”. Quem diz direito de opinião diz, ao mesmo tempo, direito à manifestação do pensamento, do conhecimento, do sentimento, da volição. Nele se inscrevem o direito à informação, a liberdade de crença, a liberdade de consciência, o direito de oposição, o direito à diferença, o direito de resistência (que não é reconhecido formalmente pela nossa Constituição), o direito à defesa e ao contraditório. 

Há casos em que pode haver crime na prolação de uma palavra. Exemplo: por ofensa à honra, por incitação ao crime. Essas, entre outras, são exceções justificadas, constitucionalmente admitidas. 

A quem esteja interessado em aprofundar essas questões, peço licença para indicar meu livro intitulado “Fundamentos de Direito Constitucional” (São Paulo, Saraiva, vol. I). 

Nosso papel é nos opormos ao golpe, com serenidade. Queremos evitá-lo, não só porque é um golpe, mas porque sabemos de onde provém, e onde quer chegar. Se vier, ele nos encontrará aqui. Certos de que, depois da noite, sempre vem o dia.

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