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sexta-feira, 21 de março de 2014

TRIBUNAL TIRADENTES III: BRASIL É NOVAMENTE CONDENADO POR ANISTIAR TORTURADORES

Foto: Douglas Mansur/RBA
Por Débora Prado, do Viomundo


Os agentes de tortura, terrorismo de Estado e autores de crime contra a humanidade não podem se beneficiar da Lei de Anistia (Lei 6.683/1979) e devem ser punidos. Foi com esta sentença que o Estado brasileiro foi mais uma vez condenado por sua omissão diante da impunidade dos crimes cometidos pela Ditadura Militar.
A decisão foi unânime entre os sete jurados presentes no 3º Tribunal Tiradentes, realizado ontem em São Paulo, e se soma a condenação do País, em 2010, pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, integrante da OEA (Organização dos Estados Americanos).
Há 4 anos, a corte internacional responsabilizou o Estado pelo desaparecimentoforçado de 62 pessoas, entre os anos de 1972 e 1974, na repressão a Guerrilha do Araguaia. Com isso, a OEA determinou: “os dispositivos da Lei de Anistia são incompatíveis com a Convenção Americana, carecem de efeitos jurídicos e não podem continuar representando um obstáculo para a investigação dos fatos”.
No tribunal realizado ontem, o cumprimento da decisão da OEA foi reivindicado pelas testemunhas de acusação arroladas pelo jurista Fábio Konder Comparato. O acusador apontou ainda que não há possibilidade de anistia ou prescrição para a prática de terrorismo de Estado, definida por ele como “o aniquilamento da oposição para instalar um clima de terror junto à sociedade”.
Comparato questionou também a legitimidade da ‘auto-anista’, uma vez que foi concedida pelo Estado a si mesmo. “Não é possível, nos casos de terrorismo de Estado, que se possa reconhecer a impunidade, porque a principal vítima é a humanidade. E nenhum Estado representa a humanidade”, frisou.
O Promotor Público Marlon Weichert, testemunha de acusação, declarou ainda que a anistia aos agentes públicos perpetradores de graves violações aos direitos fundamentais e humanos é inconstitucional: “Tortura, execução sumária, violência sexual e desaparecimento forçado”, enumerou, disparando: “uma lei garantidora da impunidade destes crimes afronta diretamente diversos princípios da Constituição brasileira”.
A representante da testemunha pela Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, Amelinha Teles, destacou também que as violações se sobrepõem numa densa lista de graves crimes: “cada desparecido da Ditadura representa a prática dos crimes de sequestro, tortura, assassinato e ocultação de cadáver”, frisou, lembrando que há ao menos 437 nomes nesta lista,segundo o Dossiê dos Mortos e Desaparecidos Políticos.
Ao desembargador Antonio Carlos Malheiros coube a tarefa de realizar a defesa da interpretação dada a Lei. O advogado fundamentou sua argumentação no risco de insegurança jurídica que a revisão da Lei de Anistia poderia gerar, uma vez que o Supremo Tribunal Federal (STF)  decidiu por sua manutenção tal comoestá em 2010.
A defesa, entretanto, não foi suficiente para convencer um só jurado no decorrer do Tribunal, que durou pouco mais de três horas. Assim, a corte presidida pelo jornalista Juca Kfouri, proferiu sua sentença: “não podem ser beneficiados pela Lei 6.683/1979 todos os autores de crimes contra a humanidade, tais como homicídio, tortura, estupro, seqüestro, desaparecimento forçado, ocultação e destruição de cadáveres de oponentes políticos”.
A decisão atinge não só autores de tais crimes, como também todos os agentes estatais que planejaram, ordenaram ou auxiliaram a perpetração das violações, por ação ou omissão. A condenação se estende ainda aos dias atuais: responsabiliza todos integrantes de órgãos públicos dos poderes executivo, legislativo e judiciário que seguem descumprindo a sentença da OEA.
Ato simbólico reivindica ação do Estado
Embora o Tribunal realizado ontem não tenha valor jurídico, o ato simbólico busca mobilizar a sociedade para cobrar a enorme dívida do Estado brasileiro com a verdade e a justiça no mês em que golpe militar completa 50 anos. A intenção é que a iniciativa motive medidas reais no sentido da sentença proferida.
“Estamos fazendo um julgamento simulado de um aspecto específico da Lei de Anistia: o artigo 1º, parágrafo 1º, que estendeu a anistia também aos agentes do Estado. A questão discutida aqui é a seguinte: os integrantes do aparelho da repressão política podem continuar sendo beneficiários da Lei de Anistia?”, explicou o ex-deputado federal Luiz Eduardo Greenhalgh, advogado de presos políticos na época, que abriu o evento.
Ao final do julgamento simulado, uma cópia da sentença – que congrega a reivindicação das dezenas de entidades e centenas de pessoas que lotaram o TUCA (Teatro da Universidade Católica) – foi entregue ao padre Julio Lancelotti, que assumiu o compromisso de repassá-la ao papa Francisco.
Outra cópia foi entregue à representante da Comissão Nacional da Verdade (CNV) no evento, a psicanalista Maria Rita Kelh, buscando que a revogação o artigo 1º conste nas recomendações que a instância deve incluir em seu relatório até o fim do ano.
Kehl assumiu publicamente o compromisso de endossar a reivindicação junto à Comissão Nacional. “Eu sei o que é a insegurança de uma sociedade inteira que sente que não pode confiar nos agentes do Estado destinados a protegê-la.Tenho a esperança de que, se essa sentença for cumprida, o País inteiro vai se sentir mais seguro, porque estará declarado, finalmente, que ninguém está acima da lei”, disse.
Além disso, o ato reivindicou que Projeto de Lei 573/ 2011, de autoria da deputada federal Luiza Erundina (PSB-SP), seja desengavetado e aprovado no Congresso Nacional. Erundina também participou do ato como testemunha de acusação e apontou: “Se foi o Legislativo que aprovou essa lei, esse mesmo Poder também tem a prerrogativa de rever essa decisão. Mas, sem pressão política, este projeto não andará”. O PL está parado na Comissão de Justiça e Cidadania da Câmara sem previsão de voltar a pauta.
A impunidade também condena
Enquanto o País segue descumprindo a sentença da OEA, os presentes lembraram ainda que a impunidade também condena, uma vez que impõe à sociedade brasileira a convivência com os tristes legados da Ditadura Militar, sobretudo os assassinatos e violências que ainda são cometidos pelas forças de segurança do Estado.
O deputado estadual Adriano Diogo (PT), que preside a Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”, elencou no seu ‘testemunho’: “Concordar com a atual interpretação da lei é concordar que os boletins de ocorrência da PM continuem a ser preenchidos como resistência seguida de morte. É concordar com o genocídio dos indígenas, camponeses e trabalhadores rurais. É concordar com todas as chacinas e grupos de extermínio das polícias militares do Brasil, inclusive arrastando cidadãos pelas ruas em viaturas [caso da carioca Cláudiada Silva Ferreira]”
O secretário municipal de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo, Rogério Sottili, também usou seu ‘testemunho’ para lembrar a ligação dos crimes do passado com a crescente mortalidade de jovens negros e da periferia, especialmente por homicídios cometidos pela polícia.

sábado, 24 de novembro de 2012

DOCUMENTÁRIO SOBRE GUERILHA DO ARAGUAIA ENFURECE MILITARES

Militares se exaltam durante exibição de documentário sobre o Araguaia. Esbaforido e nervoso, oficial militar gritou no meio da sessão, orientando grosseiramente que todos os seus subordinados se retirassem dali

Do site Pragmatismo Político

Militares do Comando da 23ª Brigada de Infantaria de Selva, no Pará, se exaltaram durante a reunião do Grupo de Trabalho do Araguaia (GTA), em Marabá (PA), quando começou a exibição de um documentário com depoimentos de camponeses vítimas dos militares durante a Guerrilha do Araguaia. Transtornado, o coronel Celso Osório Souto Cordeiro, interrompeu a sessão aos berros, ordenando que seus subordinados abandonassem o salão.

O oficial bateu boca com o representante da Secretaria de Direitos Humanos (SDH) no grupo, Gilles Gomes. A discussão só não virou agressão física graças à intervenção de integrantes do Ministério da Defesa. O fato ocorreu no dia 23 de outubro e só agora foi divulgado.

“Militares, todos fora!”, gritou na ocasião o militar que, em julho, fora condecorado com a Medalha do Pacificador, concedida pelo Comando do Exército.

O GTA foi criado pelo governo para cumprir a sentença judicial de buscar informações e tentar localizar restos mortais de desaparecidos políticos na região. O Exército tem dado apoio logístico às ações desde 2009.

Esse foi o primeiro atrito entre militares e civis desde então. O grupo é formado por representantes dos ministérios da Defesa e da Justiça e da Secretaria de Direitos Humanos.

Internamente, a atitude do coronel foi considerada grave, mas superável. Oficialmente, o Ministério da Defesa e a Secretaria de Direitos Humanos informaram que estão tratando do assunto. A cúpula da secretaria tem debatido o assunto e chegou a redigir uma nota pública condenando o gesto do coronel. O militar pode ser afastado das próximas expedições do GTA.

Marco Antônio Barbosa, presidente da Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos, vinculada à SDH, criticou o coronel Cordeiro:

“Isso que ocorreu foi grave. A colaboração do Exército até agora era de uma logística de boa qualidade. Foi surpreendente. Um gesto violento e incompatível com os tempos de hoje. É lamentável, e o que se espera é que seja dada uma resposta à altura”, afirmou Barbosa.

Sete parentes de desaparecidos e vítimas da ditadura que estavam presentes ao encontro elaboraram uma carta aos ministros da Defesa, da Justiça e dos Direitos Humanos na qual repudiam o fato. No texto, eles fazem um protesto contra a “atitude malsã e desequilibrada do oficial militar”.

Ex-vereador pelo PCdoB, Paulo Fonteles Filho, observador do grupo presente à reunião, escreveu no seu blog: “(O coronel) esbaforido e nervoso gritou, no meio da sessão, orientando grosseiramente que todos os seus subordinados se retirassem dali”.

Audiência

O Comitê Paraense pela Memória, Verdade e Justiça e a Associação dos Torturados na Guerrilha do Araguaia (ATGA) realizam na sexta-feira (16) e sábado (17), também em Marabá, uma audiência pública da Comissão Nacional da Verdade. O evento busca o restabelecimento da verdade em relação aos atos de torturas, desaparecimentos e mortes praticados por agentes da ditadura militar na região durante a repressão à Guerrilha do Araguaia (1972-1975).
Participam da audiência camponeses, indígenas, militantes de direitos humanos e representantes da Comissão Nacional da Verdade, Maria Rita Kehl, Claudio Fonteles e Paulo Sérgio Pinheiro.

 

terça-feira, 29 de novembro de 2011

DITADURA MILITAR: SENTENÇA SOBRE A GUERRILHA DO ARAGUAIA COMPLETOU UM ANO




Dia 24 de novembro fez um ano que a Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o Brasil por violações de direitos humanos no caso da “Guerrilha do Araguaia”.

A Corte é um órgão judicial internacional autônomo do sistema da Organização dos Estados Americanos, criado pela Convenção Americana dos Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica) e tem competência de caráter contencioso e consultivo para conhecer e julgar casos de violação aos direitos humanos dos Estados-Partes que tenham reconhecido a sua competência. O Brasil é signatário da Convenção desde 1992, quando depositou a carta de adesão à Convenção, portanto, tem o dever de cumprir as decisões da Corte.

O processo é consequência de uma petição de agosto de 1995, apresentada pelo ‘Centro pela Justiça e o Direito Internacional’ (CEJIL) e pela ‘Human Rights Watch/Americas’, em nome de pessoas desaparecidas no contexto da Guerrilha do Araguaia e seus familiares junto à Comissão Interamericana de Direito Humanos (CIDH) denunciando as violações aos direitos humanos pelo Estado Brasileiro entre 1972 e 1975, contra camponeses da região e membros do Partido Comunista do Brasil (PC do B).

A Comissão, após expedir relatório de admissibilidade, decidiu submeter o caso à jurisdição da Corte, considerando que representava "uma oportunidade importante para consolidar a jurisprudência interamericana sobre as leis de anistia com relação aos desaparecimentos forçados e à execução extrajudicial e a consequente obrigação dos Estados de dar a conhecer a verdade à sociedade e investigar, processar e punir graves violações de direitos humanos".

A Comissão também submeteu o caso à Corte porque, "em virtude da Lei No. 6.683/79 [...], o Estado não realizou uma investigação penal com a finalidade de julgar e punir as pessoas responsáveis pelo desaparecimento forçado de 70 vítimas e a execução extrajudicial de Maria Lúcia Petit da Silva [...]; porque os recursos judiciais de natureza civil, com vistas a obter informações sobre os fatos, não foram efetivos para assegurar aos familiares dos desaparecidos e da pessoa executada o acesso a informação sobre a Guerrilha do Araguaia; porque as medidas legislativas e administrativas adotadas pelo Estado restringiram indevidamente o direito de acesso à informação pelos familiares; e porque o desaparecimento das vítimas, a execução de Maria Lúcia Petit da Silva, a impunidade dos responsáveis e a falta de acesso à justiça, à verdade e à informação afetaram negativamente a integridade pessoal dos familiares dos desaparecidos e da pessoa executada".

A detenção arbitrária, tortura e desaparecimento forçado de cerca de 70 pessoas, provocadas pelas Forças Armadas da ditadura militar, tinha por objetivo erradicar a Guerrilha do Araguaia a qualquer custo.

Ao condenar o Brasil, pelas gravíssimas violações aos direitos humanos ocorridas durante a ditadura militar, a Corte declarou sem efeitos jurídicos a lei de anistia na parte que impede a investigação e punição dos responsáveis por tais violações, determinando que o Estado conduza eficazmente a investigação de forma a levar a condenação os responsáveis civil e criminalmente.

Deve o Estado brasileiro investigar e identificar o paradeiro dos desaparecidos e, se for o caso, saber onde se encontram os restos mortais e ainda dar tratamento médico e psicológico adequado aos familiares das vítimas e publicar a sentença nos meios de comunicação, ou seja, cumprir a Constituição Federal.

Mas, o Estado brasileiro se submete as decisões da Corte?

O ministro do STF Cezar Peluso, no dia 18/1/11, referindo-se ao Caso do ex-ativista italiano Cesare Battisti afirmou que: "Nenhuma corte internacional tem competência para rever, cassar, reformar ou interferir em qualquer decisão do STF"

Ora! ao aderir livremente à Convenção, o Brasil obrigou-se a respeitar as decisões da Corte, comprometendo-se a adequar seu ordenamento jurídico à realidade internacional, bem como todos os poderes públicos devem estar em harmonia com a convenção.

Uma decisão do STF no sentido da não obrigatoriedade do cumprimento da decisão da Corte é claramente equivocada, o que poderá este Tribunal declarar é a inconstitucionalidade da adesão do Brasil à Convenção, neste caso, o Brasil terá que denunciar a Convenção e a partir daí as decisões daquela Corte não mais valerão no Brasil. Vale lembrar que há entendimento doutrinário no sentido de que não é possível tal denuncia dada a natureza do tratado.

Quais providencias foram tomadas até hoje no sentido de cumprir a sentença?

Em maio deste ano a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República formou uma Comissão Interministerial, integrando a Secretaria de Direitos Humanos e os Ministérios da Justiça e da Defesa com o objetivo de intensificar as buscas dos corpos de desaparecidos durante a Guerrilha do Araguaia (lembrando que antes a pasta era de responsabilidade apenas do Ministério da Defesa conduzida pelo então Ministro Nelson Jobim).

Outra providência foi a aprovação da Lei que regula o acesso a informações ( Lei nº 12.527, de 18/11/2011) e da Lei que criou a Comissão Nacional da Verdade (Lei nº 12.528, de 18/11/2011), que permitirão aos brasileiros conhecer melhor o que aconteceu nos porões da ditadura, e ter acesso a informações de documentos oficiais.

O que se nota é que tudo está caminhando muito devagar, há, ainda, muito trabalho a ser feito pelo Governo Federal para cumprir todas as determinações da Corte. Já no Judiciário, tramita junto ao STF a ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental)153 ajuizada pelo Conselho Federal da OAB e que questiona se a Lei de Anistia agasalha os autores dos crimes cometidos durante a ditadura militar. Para o jurista Fabio Konder Comparato, que assina a Petição Inicial “... os agentes públicos, que mataram, torturaram e violentaram sexualmente opositores políticos, entre 02 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979, não praticaram nenhum dos crimes definidos nesses diplomas legais, pela razão de que não atentaram contra a ordem política e segurança nacional. Bem ao contrário, sob o pretexto de defender o regime político instaurado pelo golpe militar de 1964, praticaram crimes comuns contra aqueles que, supostamente, punham em perigo a ordem política e a segurança do Estado”.

Os instrumentos estão ai, a questão é saber se haverá vontade política suficiente para mudar o estado das coisas, resgatar esse período obscuro de nossa história e enfrentar, de uma vez por todas, os fantasmas da ditadura militar.