A ASSOCIAÇÃO JUÍZES PARA A DEMOCRACIA, entidade não
governamental e sem fins corporativos, que tem por finalidade estatutária o
respeito absoluto e incondicional aos valores próprios do Estado Democrático de
Direito, vem a público externar repúdio e contrariedade em face dos atos de
violência e repressão que atentam contra o livre exercício do direito de livre
manifestação, ocorridos nos dias que sucedem à deposição da presidenta eleita
Dilma Vana Roussef, esperando do Ministério Público o efetivo controle da
atividade policial, nos seguintes termos:
1. A livre manifestação do povo encontra guarida no seio do
corpo democrático, conforme o art. 5º da Constituição da República, que
estabelece ser livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato, podendo
se reunir pacificamente em locais abertos ao público, independentemente de
autorização, sendo desnecessário registrar, no presente instrumento, o alto
custo social pago durante os regimes de exceção para que tal direito fosse
erigido à estatura constitucional.
2. Diversos atos e fatos no pós 31 de agosto de 2016
demonstram o total despreparo do braço policial do Estado para a escorreita
aplicação e preservação da Constituição da República. Nesse sentido, têm-se
notícias de uso indiscriminado de balas de borracha contra manifestantes em
geral em diversas cidades; tem-se a notícia de estudante que perdeu a visão do
olho esquerdo em São Paulo; tem-se a notícia de advogado preso e agredido, em
Caxias do Sul, quando se encontrava no exercício da função de defender cidadãos
contra abusos oficiais; tem-se, ainda, a notícia de manifestantes presos
mantidos incomunicáveis por várias horas e de agressão gratuita contra pessoas
que participavam do ato pacífico ocorrido em São Paulo no dia 4 de setembro, o
que foi testemunhado na pele por repórter da BBC Brasil, violentamente atacado
por policiais.
3. O uso da força tem se mostrado desproporcional, por todo
o Brasil. A violência praticada envolve lançamento de gás, bombas, disparo de
balas, ocasionando lesões corporais indiscriminadas de natureza grave e prisões
arbitrárias, tudo em desrespeito primário à cidadania e aos direitos
fundamentais.
4. A repressão que impede o exercício pleno de tal direito
elementar milita contra a Democracia, contra a Constituição, contra o povo,
muito especialmente contra os que tombaram na construção da ordem
constitucional vigente.
5. É imprescindível, por tudo isso, que o Ministério Público
exerça sua função prevista no artigo 129, VII, da Constituição da República,
fiscalizando a atividade policial e exigindo, dos responsáveis pelo comando da
polícia e dos próprios secretários da segurança e governadores estaduais, o
pleno respeito às liberdades democráticas. Espera-se que o Ministério Público
exerça tal função considerando que, em uma democracia fundada na promessa de
construção de sociedade livre, justa e solidária, como previsto no art. 3º, I,
da Constituição da República, o direito de manifestação é garantido não apenas
à parcela da população que apoia um determinado grupo político; tal direito
assiste aos manifestantes defensores das mais diversas ideologias e agremiações
políticas que, sob um regime democrático, deveriam alcançar o poder apenas pelo
voto popular.
6. A defesa das liberdades públicas é dever constitucional
atribuído a todo sistema de Justiça, inclusive ao Ministério Público na
fiscalização da atividade policial. A Associação Juízes para a Democracia
reitera que o sistema de Justiça afeto à Constituição é aquele que respeita o
direito constitucional de livre manifestação e aceita o pluralismo de ideias.
Urge reorientação no sentido de uma inflexão na escalada ascendente de
desrespeitos e rupturas constitucionais vivenciadas na quadra atual.
São Paulo, 5 de setembro de 2016.
A Associação Juízes para a Democracia
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